Que a internet se
tornou uma das principais ferramentas de comunicação do mundo, isso é fato.
Inclusive, ela proporcionou que movimentos sociais pudessem se reunir a partir
das plataformas de mídias sociais, trazendo benefícios para a luta contra o
racismo. Hoje, é possível enxergar a comunidade negra com mais acesso à
informação, mais unida e fortalecida, seja compartilhando afeto preto ou suas
dores. No entanto, meio a essa era da superinformação também existe barreiras
para serem quebradas, por exemplo, o racismo algorítmico.
Você já ouviu falar em “racismo algorítmico? Segundo Sil Bahia, Mestre em Cultura e Territorialidades pela
Universidade Federal Fluminense, em entrevista ao site Hypeness, “o racismo algoritmo ocorre
quando sistemas matemáticos ou de inteligência artificial são pautados por
informações enviesadas/tortas que alimentam e regem seu funcionamento. As
consequências são muitas, mas talvez a maior delas seja o aumento de
desigualdades, sobretudo em um momento onde estamos cada vez mais tendo muitos
dos nossos gostos e políticas mediadas por máquinas, com o avanço da
tecnologia”.
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Sil Bahia – Foto retirada do site Hypeness |
Tarcízio Silva, autor dos livros “Estudando Cultura e Comunicação em
Mídias Sociais” (2018) e “Para Entender o Monitoramento de Mídias Sociais”
(2012), critica os algoritmos e as mídias sociais sobre os vários tipos de
discriminação que eles geram, como racismo e misoginia. Segundo o pesquisador, “na
maioria dos casos não os algoritmos em si, mas os sistemas onde são empregados
podem ter resultados racistas e discriminatórios. Elaboro o conceito de
‘racismo algorítmico’ para descrever como interfaces e sistemas automatizados,
tais como plataformas de mídias sociais, podem reforçar e, pior, ocultar as
dinâmicas racistas das sociedades onde são usados e empregados”.
“Como sociedades racistas constroem consequentemente tecnologias com
potenciais ou aplicações discriminatórias”, frisa Silva ao se referir que o
problema não está no algoritmo em si.
Exemplos de
algoritmos racistas
Inúmeros podem ser os exemplos de
como esses algoritmos agem de forma discriminatória, propagando a
invisibilidade do negro. Silva lembra de um vídeo que viralizou em 2009, onde o
software da HP não conseguia identificar os rostos de pessoas negras. Isso
aconteceu há dez anos, mas situações como essas ainda persistem.
Outro exemplo aconteceu nos Estados Unidos quando um computador foi
desenvolvido para identificar possíveis reincidentes criminais. Uma análise
feita pela agência norte-americana ProPublica mostrou que o algoritmo
identificava que entre 7 mil detentos, os de pele negra tinham mais chances de
cometer crimes novamente se comparado com os brancos. Acontece que 45% dos réus
negros considerados de “alto risco” não voltaram a cometer crimes, o que
comprova o quão racista pode ser considerado esses algoritmos.
Se partirmos para o campo da saúde, temos como exemplo um algoritmo usado
por hospitais e seguradoras para ajudar a administrar as condições de saúde dos
seus pacientes. Acontece que pesquisadores americanos descobriram que o sistema
também agia de maneira discriminatória, onde pessoas negras eram impedidas de
terem acesso a cuidados de saúde necessários.
Publicado pela revista Science,
o resultado da pesquisa mostrou que pessoas negras com as mesmas necessidade ou
tão doentes quanto pessoas brancas tinham menos chances de serem encaminhadas
para programas com necessidade médicas complexas. As pessoas negras tinham
classificações de risco mais baixas.
O próprio Google apontou uma postura racista ao associar “tranças
bonitas” a pessoas brancas e “tranças feias “ a pessoas negras. O assunto gerou
um grande debate nas redes sociais. Inclusive, convidamos você a fazer o teste
abrindo uma aba de imagens para tranças bonitas e outra para tranças feias.
Como mudar essa
realidade?
É preciso criar ambientes empresariais de tecnologia mais diversos.
Estamos cercados por um mercado onde negros são exceções e fazem parte de
setores menos expressivos. Nesse sentido, fica difícil ter uma visão
antirracista quando tudo que é feito é criado por homens, brancos e héteros. A
diversidade contribui para questões sociais e de inclusão que estruturam a
sociedade.
“Sempre a vejo como
uma faca de dois gumes, onde por um lado conseguimos nos conectar, produzir
conteúdo que fortaleça a identidade negra, porém, ao mesmo tempo, quando
olhamos para os dados percebemos que o que acontece no offline é reproduzido no
online. Mulheres negras são as que mais sofrem com exposição na internet,
violações de direitos e por aí vai. Acho que para virar o jogo precisamos
estimular que as pessoas queiram entender melhor sobre esses processos e não do
ponto de vista técnico, mas principalmente sobre os impactos. É importante
reforçar sempre que tecnologia não é neutra, que reproduz comportamentos,
visões de mundo, cultura de quem as cria, e sabemos que as tecnologias que
usamos são em sua maioria criadas por homens, brancos, heterossexuais do
hemisfério norte”, destaca Sil Bahia.
Dados coletados em
2016 pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) mostram a falta de inserção do
negro no mercado de tecnologia. Cerca de 92% dos setores de engenharia de
equipamento em computação tem predominância branca. A
maioria dos negros ainda está presa ao mercado informal e 50% deles são
empreendedores, segundo o Sebrae Brasil.
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