A cultura do branqueamento ou
embranquecimento surgiu na Europa entre o final do século XIX e meados do
século XX. O termo pode ter dois entendimentos: internalização de modos dos
brancos e perda dos modos, cultura da matriz ou um clareamento visível no
fenótipo da cor da pele da população.
A eugenia foi incentivada no Brasil ainda
no governo de Dom Pedro I com a vinda de europeus para usufruir de mão de obra
livre, assalariada. A proposta contou com o apoio da elite e de intelectuais da
época. Nesse período, pregava-se a ideia de que o branco era superior a outras
raças. Por isso, como todos sabemos, não houve preocupações para que o negro recém-liberto
pudesse se integrar à sociedade ou tivesse algum tipo de política pública a seu
favor.
“Políticas de incentivo a imigração de
alemães, italianos e espanhóis foram intensas no decorrer do século XIX e XX.
Com o branqueamento da nação pretendia-se atingir uma higienização moral e
cultural da sociedade brasileira. Clarear a população para progredir o país
passou a ser um projeto de nação defendido no século XIX, mas que avançou pelo
século XX. Projeto que envolvia eugenização e a higienização social enquanto
políticas públicas”. (Antonio Carlos Lopes Petan, 2013)
Diferente da eugenia europeia, que
acreditava que a miscigenação era uma degeneração de raças e que poderia trazer
consequências para a evolução humana, o Brasil tinha como objetivo que toda a
população fosse branca num período de no mínimo 50 anos e no máximo 200 anos.
Havia até uma classificação para os mestiços de acordo com seu grau de
branquitude: quase branco, semibranco e sub-branco.
“A aceitação de uma perspectiva de
existência de uma hierarquia racial e o reconhecimento dos problemas imanentes
a uma sociedade multirracial somaram-se a ideia de que a miscigenação
permitiria alcançar a predominância da raça branca. A tese do branqueamento
como projeto nacional surgiu, assim, no Brasil, como uma forma de conciliar a
crença na superioridade branca com o progressivo desaparecimento do negro, cuja
presença era interpretada como um mal para o país” (Jaccoud, 2008).
Foi ensinado que o fenótipo do negro era feio
a ponto dos próprios afrodescendentes não quererem passar adiante seus traços
ou sentir vergonha de suas raízes africanas. As teses eugenistas também
defendiam que o homem branco tinha o padrão de melhor saúde e competência
civilizacional comparada a outras raças, como a amarela (asiáticos), a vermelha
(indígenas) e negra (africana). Queriam que os descendentes progressivamente
passassem a gerar mais brancos a cada prole.
Quadro “A Redenção de Cam”, de 1895, do
pintor espanhol Modesto Brocos.
O quadro mostra uma mulher mestiça com um filho branco no colo, um homem branco ao lado e uma mulher negra dando graças pela criança ter nascido branca.
O quadro mostra uma mulher mestiça com um filho branco no colo, um homem branco ao lado e uma mulher negra dando graças pela criança ter nascido branca.
Um dos principais expoentes da tese
eugenista no Brasil foi o antropólogo e médico João Baptista de Lacerda. Ele
participou, em 1911, do Congresso Universal das Raças, em Londres. No evento,
levou o seu artigo intitulado “Sur les métis au Brésil” (Sobre os
mestiços do Brasil). Um dos trechos do artigo dizia que “a população mista
do Brasil deverá ter pois, no intervalo de um século, um aspecto bem diferente
do atual. As correntes de imigração europeia, aumentando a cada dia mais o
elemento branco desta população, acabarão, depois de certo tempo, por sufocar
os elementos nos quais poderia persistir ainda alguns traços do negro”.
A ideologia eugenista é uma herança que a
sociedade brasileira carrega até hoje. Afinal, somos ensinados desde cedo que o
padrão eurocêntrico é o ideal – loiro, olhos azuis e cabelo liso. Essa pauta só
fortalece o racismo estrutural que vivemos no dia a dia. É preciso se enquadrar
no ideal que nos foi imposto, seja alisando nossos cabelos, negando nossos
traços e não se identificar como pessoa negra. Falamos há algum tempo sobre
colorismo aqui no blog e como o tom de pele e fenótipos de uma pessoa negra
pode torná-la aceitável ou não na sociedade.
Toda essa carga eurocêntrica que recebemos
diariamente foi muito bem estudada e planejada desde muito tempo. Todas as
pautas nos levam a estudar e buscar entender os motivos para o qual estamos
sujeitos a não nos orgulhar de nós mesmos como pessoas negras, seja pela nossa
cor, nosso corpo, nossos fenótipos, cabelo etc. A resposta sempre terá um único
ponto: a escravidão.
Hoje, estamos despertando para uma nova
fase. Os movimentos negros têm tido bastante crescimento no Brasil. O
empoderamento negro vindo com a era da informação ajuda a fortalecer nossas
raízes. Estamos reforçando nossa identidade, assumindo nossos cabelos e
acolhendo uns aos outros através do afeto preto. Essa articulação tem causado
incômodo, afinal, no Brasil o racismo não só é estrutural como institucional.
Nenhum comentário:
Postar um comentário